Proponho-me colecionar aqui certos costumes antigos que me vêm à memória. Entre eles, alguns nós conservamos; outros divergem dos nossos. Ante o espetáculo dessas mudanças contínuas das coisas humanas, nossa inteligência talvez se aclare e nosso julgamento se torne mais estável.
Dizemos combater com capa e espada. Isso já se praticava no tempo dos romanos, e César diz: “envolvem a mão esquerda no saio e puxam a espada”.
Os antigos tomavam banhos cotidianos, antes das refeições
e os tomavam tão seguidamente quanto nós lavamos as mãos.
A principio apenas lavavam os braços e as pernas. Mais tarde, porém
(e isso durou séculos e se propagou por toda a parte) mergulhavam
completamente nus em banhos acrescidos de substâncias perfumadas.
Empregar água natural era prova de grande simplicidade. As pessoas
particularmente delicadas e requintadas perfumavam todo o corpo ao menos
3 ou 4 vezes por dia. Arrancavam todos os pêlos como nossas mulheres
se acostumaram a fazer com os da fronte, de algum tempo para cá:
“tens o peito, as pernas e os braços depilados” (Marcial) e os arrancavam,
embora possuíssem ungüentos para o mesmo fim: “Unta a
pele de ungüento depilatório ou a embebe em giz derretido em
vinagre”(Marcial). Gostavam de deitar-se em leitos muito moles e consideravam
prova de austeridade fazê-lo em colchões. Comiam reclinados
sobre camas, mais ou menos como os turcos atualmente: “Então, de
cima do leito, assim falou Enéias” (Virgílio). Dizem que
desde a batalha de Farsália, em sinal de luto pelo péssimo
estado dos negócios públicos, Catão, o Jovem, comeu
sempre sentado, adotando uma vida austera.
Beijavam as mãos dos grandes para os homenagear e adular. E
beijavam-se entre amigos, como os venezianos: “e eu te saudarei com palavras
e beijos” (Virgílio). E tocavam os joelhos dos grandes a quem saudavam
ou de quem solicitavam alguma coisa. Pásicles, filósofo,
irmão de Crates, em vez de levar a mão ao joelho de alguém
a quem se dirigia, levou-as às partes genitais. Repelindo-o brutalmente
o outro, disse-lhe Pásacles: “Pois não achas que esta parte
do corpo vale tanto quanto qualquer outra?” Comiam frutas no fim da refeição,
como o fazemos também. Limpavam o cu (deixemos às mulheres
a vã superstição das palavras) com uma esponja; eis
por que o vocábulo spongia é obsceno em latim. Essa esponja
era fixada na extremidade de um bastão, como o prova a história
do indivíduo que, levado às arenas a fim de ser entregue
às feras, pediu para satisfazer suas necessidades e não tendo
outro meio de suicídio, enfiou a esponja e o bastão na garganta,
asfixiando-se.
Enxugavam o membro com tecido de lã perfumado depois de usá-lo:
“não te farei nada senão te lavar com esta toalha de lã”,
diz Marcial. Havia nos cruzamentos das ruas em Roma recipientes e meias-tinas
para que os passantes urinassem dentro: “Não raro os meninos, em
sonho, pensam erguer suas vestimentas diante da tina em que se urina” (Lucrécio).
(...)
Mesmo quando estavam nas salas em que tomavam seus banhos de vapor,
as mulheres recebiam visitas dos homens. E aí se entregavam aos
cuidados de seus criados, que lhes faziam massagem e as untavam: “um escravo,
com um avental de couro preto, aguarda tuas ordens, quando, nua, tomas
teu banho quente” (Marcial). Tinham certos pós para absorver o calor.
Os antigos gauleses, diz Sidônio Apolinário, usavam os
cabelos compridos na frente e curtos atrás, moda que vem sendo seguida
neste século de costumes efeminados e relaxados.
(...)
Para as senhoras de Argos e Roma, o branco era a cor do luto, como
entre nós até bem pouco tempo, costume que não se
devia ter abandonado, a meu ver.
Mas há livros inteiros sobre esses assuntos.